terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Morretes, a sua história, a nossa identidade


Este texto foi publicado em 1º de fevereiro de 2007.

Dos 13 alunos que terminaram o ginásio em 1953, dois moram aqui em São Paulo: eu e o Adaulino Rocio de Castro Pinto. Para uns, Nino para outros.

Há uns cinco ou seis anos (por volta de 2001) Adaulino foi a Morretes e na volta comentou comigo: cheguei lá e não encontrei a minha Morretes. De fato, a nossa Morretes não mais existe. Nós mesmos somos outros. Éramos adolescentes, pós-adolescentes e hoje somos sexagenários, pós-sexagenários, septuagenários, todos portadores da história que sentimos como não fosse em nós, mas em um “nós outros”, nossos alter egos na forma de “nós-ontem”, portadores da nossa história.

Isto quer dizer o seguinte: nós que vivemos fora e longe de Morretes não vivemos o seu presente, mas a sua história. A nossa Morretes é a Morretes da história. Somos como nexos da história com o tempo presente.

Esta introdução, meio filosófica, meio antropológica, meio estrambótica, é para falar da Cida. Cida é uma minha nova amiga, uma nova amiga virtual, na linguagem do “internetês”. Foi Morretes que nos aproximou e foi assim ela que me encontrou.

Tenho um fotoblog, isto é, um espaço na Internet, onde coloco fotos de Morretes. As fotos são recentes, mas os comentários que faço a cada uma delas “são do meu tempo”. Relembro pessoas e imagens com as quais convivi. Ali coloco a “minha verdade”, as minhas lembranças. Morretes, na minha visão de mundo, é o nome do fotoblog (http://cherobim.fotoblog.uol.com.br/). Dentre as fotos há uma foto do Grupo Escolar “Miguel Schleder”, com as suas palmeiras imperiais.

Um dia recebi uma mensagem da Cida, uma mensagem emocionada. As suas palavras foram mais ou menos estas: “eu vi o seu fotoblog! Você me devolveu uma parte da minha historia”. Ela era menina quando o seu pai foi trabalhar em Morretes. As suas lembranças eram poucas, mas as fotos e os comentários permitiram reconstruir parte da sua memória.

Passado algum tempo, Cida fez outro pedido: queria localizar o local onde morou. Isto estava fora do meu alcance, pois não recordava de nenhum dos nomes que ela citou. As suas informações eram lembranças do seu tempo de menina. E isto há muito tempo!... Que fazer? Lembrei-me: um trabalho para Super Odith!

Coloquei as duas em contato, e Cida passou algumas informações  que (Super) Odith foi juntando os pedaços. Com  fotos do Google Earth e uma foto aérea de Morretes eu ia transformando em imagens o que Odith lembrava e descobria. Até chegar na casa onde Cida morou.

Cida ficou emocionada por ter mais um pedaço da sua história. Eu fiz uma viagem da história para o presente e Odith viajou no sentido contrário, do presente para a história.

Muitas pessoas e imagens da historia de Morretes se fizeram presentes. Dona Margarida, a parteira de Morretes. Juca Pereira, ex-prefeito municipal e ex-vizinho da Cida menina. A casa do seo Felix, herói da meninada, galopando pelas ruas da cidade quando um boi fugia. Ele e o seu fiel escudeiro, um aprendiz que se tornou um exímio boiadeiro. No momento foge-me o seu nome. Era o filho da Bucheira (uma senhora que vendia bucho e cebo de bois para as mulheres que faziam sabão em casa). A corrida de bois na cidade era uma festa. Uma correria.

Outras imagens começaram a se compor na minha memória: a rua da fábrica com os seus botecos cheios de gente; a fábrica de papel em funcionamento e a troca de turnos de operários; os trens manobrando e as Marias-fumaças indo se abastecer na Caixa de Água, manobrada pelo seo Baiano. O movimento de caminhões, carroças, tratores com reboque, transportando cana para a usina de açúcar. E nós correndo atrás para roubar cana. E a comentar, nos intervalos, os carroceiros que melhor estalavam os chicotes.

 O trânsito rodoviário de Curitiba para Paranaguá que passava por dentro da cidade. Era uma Morretes que pulsava uma vida que não mais existe, mas que ainda pulsa em cada um de nós que fomos tocar a nossa vida em outras terras brasileiras.