segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Carta Aberta

Recebi uma carta aberta de Izaltino Tonetti, amigo desde o nosso curso primário (hoje chamado de fundamental). Fomos alunos da minha mãe e Tino nos conta um falto que lhe foi marcante. Passarei a palavra a ele, mas à frente, transcrevendo a sua carta.

É gratificante falar da nossa mãe. Ela faleceu há 57 anos. 58 anos em março próximo. Os seus últimos alunos estão, hoje, na faixa dos 70 anos. Há 16 anos  ela é nome de uma escola. Fico imaginando os alunos ficarem a pensar “quem é Dulce Serôa da Motta Cherobim?”.

A minha mãe faleceu jovem.  Com 45 anos. Muito jovem aos padrões de hoje. Foi uma professora prestigiada, muito ciosa da sua atividade. Fui aluno dela por duas vezes.  Uma vez na escola primária e outra vez no ginásio, atuais quatro últimas séries do curso fundamental.

Quando um filho fala dos seus pais fica a pairar no ar uma suspeição, mas posso dizer que eu não fui um bom filho o quanto eu tive uma boa mãe. Digo o mesmo com relação ao meu pai.

A minha mãe educou os seus filhos e viveu numa época diversa da atual e numa cidade pequena e relativamente isolada. E a professora que tinha um filho entre os seus alunos tinha que tomar certos cuidados, poias tanto agora como naquela época os pais sempre foram ciosos pelas notas escolares dos seus filhos. Muitas vezes ela me chamava a atenção como exemplo à classe. Nunca fui um bom aluno durante toda a minha vida escolar, mas também nunca fui dos últimos. E a carta do Tino conta um destes fatos, como disse acima, marcante para ele. Eu não me lembro deste fato que ele narra.

Mas tenho que fazer uma retificação. Fomos alunos da minha mãe no grupo escolar quando funcionava onde hoje está o Colégio Rocha Pombo. Deveríamos estar no 2º ano do primário. A mudança para  o prédio da rua XV, recém construído, foi no ano letivo de 1948. Estávamos no 4º ano.

Izaltino Tonetti  com a palavra!


DONA DULCE,
POR IZALTINO TONETTI.
        Um dia pensei em escrever uma Carta Aberta ao colega de escola Mauro Seroa da Motta Cherobim, lembrando o nosso tempo de escola que juntos estudamos. Nossa escola se chamava "Miguel Schleder". Ela ficava de frente com a Rua XV de Novembro em Morretes, Paraná.
       Tinha na frente já com dez metros de altura, sete palmeiras "real" e que do outro lado da rua tinha o Bar e Restaurante "Barril" que era o nome dele, e que pertencia a Dona Maria Malucelli Ferreira (Mariquinha) e do lado do bar, era o Mercado de Secos e Molhados do Benedito Antunes de Oliveira..
       No tempo da safra de café a rua XV ficava cheia de caminhões carregados de café e que no Bar e Restaurante "Barril" os caminhoneiros ali almoçavam para depois seguir para Paranaguá. Tudo que se produzia no Paraná para exportar, passava pelo centro da cidade de Morretes.
       Atrás da escola havia também sete palmeiras "real", quase na beira do Rio Nundiaquara.
       lamos para a escola usando guarda pó, tênis brancos e "loirinha", que era uma sandália feita na sapataria do Sr. Horácio Martins de Andrade e do Sr. Aramys Zanardi.
       Antes de nós entrar nos formava de dois em dois, sendo que os meninos» ficavam na frente a as meninas atrás. Cantávamos o Hino Nacional ou o Hino da Bandeira. Depois entrávamos para a sala de aula, sendo que as meninas sentavam na frente e nós atrás. Nossa carteira era de madeira, com uma gaveta em baixo para por as sacolas dos cadernos. Os pés eram de ferro fundido e parafusado no chão, que era de taco de madeira.
       Na escrivaninha havia no meio um buraco para por o tinteiro, para molhar a pena da caneta para escrever. Nossa cadeira era de ferro com acento de madeira e o encosto também apoiado em dois braços de ferro e parafusado no chão. E havia uma regulagem no pé, para regular a alturas das pernas das crianças. A escrivaninha da Professora tinha o tamanho de um metro e meio de comprimento por setenta de largura. A cadeira era de madeira. O quadro-negro tinha quatro metros de largura por um metro e meio de altura. Era feito na própria parede. Era moldurado em madeira e na parte de baixo havia um espaço para por giz e o apagador. A Professora sempre escrevia no quadro-negro as lições do dia. Passava problemas que nós copiávamos no caderno onde fazíamos as continhas para chegar ao resultado final. Passava também expressões de frações decimais e ordinárias para que também achássemos o resultado. Estudávamos regras de três, regras de juros e de geometria. Também Geografia, História, Português (verbos, adjetivos, substantivos, etc), Ciências.
       Tudo isso e muito mais só uma Professora ensinava o ano inteiro. Nossa Professora tinha muita paciência. Quando alguém fazia bagunça na sala, como o Nicolino Cunha que sempre puxava o cabelo da Luzia Porcides, que sentava na frente da sua carteira. Ela alertava a Professora, dizendo assim: “Professora olhe ele aqui está puxando o meu cabelo". A Professora só olhava o bagunceiro com aquele olhar cativante, macio, amoroso que, ao vê-lo ele ficava envergonhado e ficava quieto. Como que com aquele olhar a Professora estivesse pedindo silêncio, para que ela nos pudesse ensinar.

       Certo dia a Professora passou no quadro-negro umas continhas para serem feitas. Copiamos no caderno e estávamos fazendo para achar o resultado. Aí a Professora foi de carteira em carteira para ver se estávamos fazendo certo. Ao chegar na minha carteira e ver o meu caderno ficou admirada e chamou meu colega Mauro dizendo: "venha até aqui meu filho" e você (Mauro) atendeu o pedido de sua mãe que completou: "olhe aqui meu filho porque você não faz como o Tonetti, ele ocupa todo o espaço do caderno. Onde tem espaço para fazer uma continha ele faz. E você faz uma em cada página do caderno".
       Essa reprimenda a você foi elogio para mim, vindo da Professora que era a sua própria mãe, Dona Dulce Serôa da Mota Cherobim.
       No fim do ano eu fui o primeiro da classe ao tirar a melhor nota nos exames. Ganhei da tua mãe uma caixa de chocolates.
       Aqui termino a minha carta, sentindo saudade daquela época em que o ensino fundamental era mais proveitoso.
       O que aprendemos nosso tempo, hoje só nas universidades.
       Do seu colega Izaltino Tonetti.
       Sessenta e sete anos depois...
       Morretes, Paraná, Brasil, 18 de abril de 2013.
       Telefone: (41) 3462-2589
       E-mail: Etonetti@hotmail.com